Deuses, túmulos e sábios
Melhoramentos
Antes, muito antes que o cinema resolvesse glorificar e elevar a status de herói popular um simples professor de arqueologia que se transfigurava em charmoso aventureiro em busca de relíquias pelo mundo, armado somente de chicote e chapéu, tornando-o um ícone da cultura pop do século xx, uma obra percorria o mundo, emocionando e eletrizando a imaginação. Os locais eram desertos de areia, subterrâneos escondidos, ou simples e prosaicos gabinetes de trabalho de intelectuais submersos em livros. Os ‘heróis’ eram professores universitários, lingüistas, gênios teóricos, ou pesquisadores de bibliotecas; quanto muito, um ou outro aventureiro desgarrado. As ‘aventuras’ eram longos e tediosos dias de escavações dedicados a identificar e separar vasos, colunas de paredes, ou limpar a areia dos sapatos. O enredo? Simplesmente, a história da humanidade.
C. W. Ceram foi o responsável para que a arqueologia fosse vista como tão emocionante e empolgante quanto um romance de espionagem ou qualquer filme de Indiana Jones. É um verdadeiro mérito de escritor, já que o próprio autor não era cientista. Era seu propósito apresentar esta história para todas as pessoas, leigos e estudiosos também, mas que tivesse todo o embasamento autêntico. Isto é, não queria que a literatura alterasse fatos, que se inventasse dados ou eventos, para proporcionar maior efeito na leitura. Ele foi atrás de fatos, pois acreditava que eles eram mais do que suficientes para impactar.
O seu livro é a prova cabal de que isso é possível. Lembro das noites passadas em claro, um garoto urbano de cidade grande, com a respiração suspensa e a ansiedade batendo no coração enquanto esperava a conclusão de sábio francês em sua tentativa de decifrar a linguagem de uma pedra com antigas, e aparentemente indecifráveis, inscrições. Participamos da mesma ânsia de Champollion que, quando garoto aos 13 anos, era um prodígio que já aprendia árabe, siríaco, caldaico, coopta, e aos dezoito, persa e sânscrito, e para descansar, se distraia com uma gramática chinesa (... ), só para poder comprovar que o chinês antigo tinha ligação com o árabe antigo. Sua meta, assim como a de tantos outros estudiosos, era conseguir ler o que dizia a Pedra de Roseta. Pois a pedra enganava. Tinha o “tamanho de um tampo de mesa, de basalto negro, com granulação fina, muito dura. Era polida de um lado. Apresentava três inscrições, em parte gastas e apagadas pela fricção da areia que repousara sobre ela durante dois milênios. Dessas três inscrições, a primeira, com quatorze linhas, era hieroglífica, a segunda, com vinte e duas linhas, demótica, e a terceira, com cinqüenta e quatro linhas, grega. Grega! Legível! Compreensível!”. No entanto, por mais que batalhassem, ninguém conseguia fazer corresponder as frases de grego com as frases correspondentes. Champollion foi a pessoa, aquele que conhecia o Egito tão bem quanto um habitante do local, mas sem sair do seu gabinete!
Ou então sonhamos o mesmo sonho de Schliemann que vai atrás de uma mítica Tróia, em uma época quando se acreditava que esta cidade era somente uma lenda, ou uma história bonita contada por Homero. Pois guiado unicamente pelo texto do Homero!, ele descobre não uma Tróia, mas sete!, pois foram sendo construídas uma encima da outra ao longo dos séculos (e, mais tarde, foram descobertas mais duas). A Tróia mais famosa, aquela destruída pelos gregos com o truque do cavalo de madeira, era a segunda ou terceira.
Ou então sentimos o mesmo fascínio e emoção ao abrir a tumba de Tutancamon! Ou ao descobrir o tesouro de Montezuma.
São muitas histórias, muitos os heróis, ardorosamente contadas por Ceram.
Traduzido para vinte e seis idiomas, “Deuses, túmulos e sábios” merece ser lido e relido, e fazer parte da biblioteca de qualquer amante das letras e de aventuras.
Claudinei Vieira - Desconcertos
2 Comments:
Li qdo ainda garota. E o livro me fez sonhar em ser arqueóloga. Uma paixão! Vi hoje que essa edição da Melhoramentos é a 21 !!
Valeu, Claudinei!
beijão.
Pra que repetir tudo outra vez? Subscrevo o que disse a Vera.
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