sábado, setembro 02, 2006

As Metamorfoses do Jeca Tatu

As Metamorfoses do Jeca Tatu - a questão da identidade nacional do Brasileiro em Monteiro Lobato.
Aluizio Alves Filho

Ed. Inverta, Rio de Janeiro, 2003


O livro “As Metamorfoses do Jeca Tatu – a questão da identidade nacional em Monteiro Lobato”, destaca-se pelas originais interpretações que contém. Na orelha, Gisálio Cerqueira Filho, caracteriza que em tempos de tantos questionamentos acerca da nacionalidade, em tempos de desmonte da nação, o autor ousa labutar nestas terras tão pouco cultivadas na contemporaneidade.
A busca incessante pela gênese e transformações do personagem “Jeca Tatu”, criado por Monteiro Lobato, exigiram muita perícia por parte de Alves Filho. A leitura do livro permite compreender que houve pesquisa esmerada e em diversos tipos de fontes, o que acabou permitindo ao autor revelar dados até então desconhecidos, mesmo pelos mais sagazes estudiosos lobatianos.
A última frase do livro delimita com precisão o esforço do autor: “estudar a obra de Monteiro Lobato é como abrir uma janela para o infinito”. É neste sentido, que um dos elementos produzidos pelas “Metamorfoses do Jeca Tatu” implicou em lançar um foco de luz em áreas um tanto quanto nebulosas no entendimento da obra do escritor taubateano.
São muitos os aspectos positivos e inovadores do livro que podem ser destacados, como por exemplo, a interessante relação entre Nietzsche e Lobato, presenteada ao leitor em forma de anexo da publicação. Também é prenhe de originalidade a análise empreendida na busca pelas origens dos nomes dados a alguns personagens de Lobato, como Emília, Chico Pirambóia e o próprio Jeca Tatu. Prenhe de originalidade ainda é a maneira como o autor indica as metamorfoses sofridas pelo “personagem”, não apenas na obra lobatiana, mas fora dela, como identidade nacional. Contudo, o que mais importa destacar na presente resenha, é uma descoberta feita por Alves Filho que permite retificar, mostrando a falsidade, de uma versão encontrável em incontáveis livros sobre história da literatura e sobre Lobato. A versão de que ele se tornou escritor ao sabor de uma circunstância casual, a de ter sido convidado a assinar uma coluna no Estado de São Paulo, em 1914, após o envio de uma simples carta de leitor para a redação do jornal. Essa descoberta do autor das “Metamorfoses do Jeca Tatu”, ainda não ganhou a devida amplitude entre aqueles que voltam as suas atenções para o estudo da literatura, do pensamento social brasileiro e mormente da obra de Monteiro Lobato. Vejamos como, concretamente, as coisas ocorreram, e o autor do livro resenhado, pela via da pesquisa, deu uma nova dimensão de entendimento a elas.
Monteiro Lobato, como é bem sabido, estreou como autor literário em 1918, com um livro de contos intitulado “Urupês”. O livro esgotou os mil exemplares da 1ª edição em dias. Lobato escreveu um rápido prefácio para a segunda edição, saída pouco depois do sucesso retumbante da primeira. Neste, construiu a versão de que ele, em 1914, era apenas um “humilde lavrador incrustado na Serra da Mantiqueira” que revoltado com caboclos que teriam provocado uma queimada em sua propriedade rural, em Taubaté, ocasionando grandes prejuízos em sua lavoura cafeeira, escreveu uma carta de leitor para o Estadão, apenas para lavrar o seu protesto e mostrar a impossibilidade de fazer alguma coisa para ser ressarcido por “jecas”.
No citado prefácio, para explicar o seu súbito e triunfal ingresso no mundo das letras, tendo em vista o rápido esgotamento da 1ª edição de “Urupês”, constrói a versão que vem sendo repetida inúmeras vezes e de forma acrítica por comentadores da sua obra, ou seja: que sendo um “humilde lavrador” nunca lhe passara pela cabeça ser escritor, produzir algum livro e que só o fizera incentivado pelo sucesso que a carta obtivera, uma vez que foi publicada como matéria em o Estadão e ele convidado a assinar coluna naquele jornal – a época, o de maior circulação no país.
Ao invés de simplesmente repetir a versão romanceada construída pelo próprio Lobato como tantos tem feito, Alves Filho foi à luta para examinar a questão. Entre os elementos que despertaram inicialmente suas dúvidas em relação à propalada versão estava a grande extensão (cerca de 10 páginas) da tal “missiva”. Será que o Estadão publicava cartas de tal tamanho em suas páginas na década de 10 do século passado? Para matar a charada foi à Biblioteca Nacional, onde ao levantar as respectivas edições do jornal “O Estadão” no ano de 1914 se deparou com um fato concreto: o jornal não publicava cartas de leitores, que dirá daquele tamanho. O que vez ou outra publicava eram reclamações que, entretanto, não ocupavam mais de 2 linhas. Reclamações do tipo: “Fulalo de tal, assinante do jornal e morador a rua tal, reclama que o lixo não está sendo recolhido”. Somadas às considerações expostas, encontra-se ainda o fato de que Monteiro Lobato, dentre outras incursões na imprensa – inclusive como caricaturista da revista “Fon-Fon” – ao escrever a “tal carta” já era colaborador remunerado do “Estadão”, desde o ano de 1909.
Acrescente-se ainda que ao peneirar a correspondência de Monteiro Lobato com Godofredo Rangel (cartas que compões os dois tomos de “A Braça de Gleyre), Alves Filho destaca que em sua versão pública, Lobato costumava se referir à “Velha Praga”, como uma “carta” enviada a seção de reclamações do Estadão; contudo, ao amigo confidente, observou a respeito: “publiquei a semana passada um artigo no Estado”.
Com a leitura do livro “As Metamorfoses do Jeca Tatu” muito aprendi, tendo me aberto uma “janela para o infinito”, como pode ser entendido o pensamento de Lobato, conforme a citada metáfora utilizada pelo autor.
Márcio Malta ( Nico)

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Vera, grato por postar e Nico,
grato pela resenha do meu livro. Você pegou bem a essência do texto. Destacou alguns pontos vitais, inclusive chamando a atenção para a originalidade de algumas colocações que faço.

03 setembro, 2006 23:05  
Anonymous Anônimo said...

Autor da resenha comentando:
Também agradeço pelo espaço, assim como fico feliz pelo autor do livro ter se sentido contemplado pela resenha.
Márcio Malta (Nico)
http://www.mundoemrabisco.hpg.com.br

04 setembro, 2006 14:55  

Postar um comentário

<< Home

Free Web Hit Counters
Free Counters