sábado, dezembro 08, 2007

Cozinhar é uma arte?


Paulo Grobe tem 31 anos de idade. Quando menino, aos domingos pela manhã, costumava ir ao mercado municipal com seu pai escolher os ingredientes para o almoço. Descobriu tarde a profissão de cozinheiro. Após uma tentativa frustrada em tornar-se advogado (abandonou o curso de Direito no quarto ano) decidiu entrar no mundo das panelas. Formado em Tecnologia e Gastronomia pela faculdade SENAC de Campos do Jordão, acumula passagens pelos melhores restaurantes do país como: D.O.M do chef Alex Atala, Charlô Bistro, Hotel Emiliano, todos em São Paulo. No início de 2004 assumiu a chefia da cozinha do Hotel Mercure, da rede francesa Accor, em Manaus, onde permaneceu por dois anos. Atualmente trabalha em um conceituado restaurante em Londres e sente saudades de Araçatuba e do feijão brasileiro.
-Cozinhar é uma arte?
- Cozinhar é muita coisa. Existe uma diferença abissal entre cozinhar em casa e cozinhar profissionalmente. Preparar uma refeição requer uma grande dose de generosidade; mexer com o prazer das pessoas e satisfazer suas expectativas é muito gratificante, mas quando se está atuando profissionalmente você sofre duas pressões: a da perfeição e a do tempo. Tudo tem que sair dentro do padrão e rápido. A tensão de uma cozinha de um bom restaurante em um sábado à noite é uma coisa absurda e isso rouba muito a beleza de cozinhar. Eu defino a cozinha profissional como uma ciência que se relaciona estreitamente com as artes, principalmente no processo criativo e na apresentação do prato.
- Qual o perfil do chefe de cozinha ideal?
- A primeira coisa é gostar de comer, ter um paladar curioso e uma boa memoria gustativa. A segunda é saber cozinhar, ou seja, conhecer profundamente e aplicar as técnicas de cozimento, transformando os ingredientes química e fisicamente; a terceira é amar a profissão que e muito ingrata e sacrificante. Perde-se fins de semana, feriados, e trabalha-se em media 12 horas por dia.
-Qual seu conceito sobre cozinha brasileira?
- A cozinha brasileira é uma das mais ricas do mundo. Pode ser definida como o resultado de três culturas bem distintas, a dos índios, dos portugueses e dos negros. Essa é a base. Os imigrantes europeus, vindos no século passado, trouxeram novos ingredientes e técnicas, mas não influenciaram nossa cozinha.
- Como você avalia a atual gastronomia brasileira?
- O Brasil ainda não valoriza sua gastronomia. Não se vê no país, com algumas exceções, restaurantes de comida brasileira, como se vê restaurantes franceses na Franca ou argentinos na Argentina. Mas isso esta mudando, chefs como Alex Atala, Carla Pernambuco e Mara Sales reinventaram a cozinha brasileira aplicando técnicas clássicas e modernas e levando o nome da gastronomia nacional para fora do país. O Brasil é um dos países com maior potencial turístico do mundo e o setor de alimentação, por consequência, só tem a crescer. Tomara que o arroz e o feijão tenham uma boa parcela nesse crescimento.
- Essa diversidade da cozinha brasileira é realmente conhecida no exterior?
- Sim, mas apenas por profissionais da área e amantes da gastronomia, as pessoas em geral conhecem apenas a caipirinha e algumas frutas tropicais. No restaurante em que trabalho, por exemplo, usamos manga, papaia, limão e castanha do Pará brasileiros. A culinária brasileira não é conhecida como a francesa, italiana ou japonesa, no entanto é mais rica em variedade de ingredientes e influencias que todas elas, embora não apresente uma técnica apurada e tampouco documentada. O catalão Ferran Adria, considerado hoje o maior cozinheiro do mundo, afirmou a algum tempo atrás que o futuro da gastronomia estaria no Brasil e na China e eu concordo com ele, pois são dois paises de dimensões continentais, potencial de desenvolvimento tremendo e gastronomicamente muito ricos.
- Qual sua cozinha preferida?
- Gosto da simplicidade, do rústico; sou apaixonado pelos ingredientes. Posso me emocionar com a beleza de um peixe recém pescado ou com a perfeição de um tomate. Outra coisa que me emociona são as receitas regionais, aquela comida de alma, secular, seja no Brasil ou fora dele.
- E preciso estudar pra ser chefe de cozinha?
- Ser chefe de cozinha hoje no Brasil virou sinônimo de status, a grande proliferação de faculdades de gastronomia e programas de televisão deixa isso bem claro. Cada vez mais pessoas se interessam pelos prazeres da boca, trabalhar na cozinha deixou de ser profissão de nordestino, homossexual e analfabeto e virou profissão da moda. Centenas de jovens de classes mais abastadas ingressam nas faculdades pensando que quando saírem serão chefes de cozinha. A faculdade dá um amplo conhecimento das técnicas clássicas, um panorama histórico e prático da gastronomia mundial e alguns conceitos de ordem teórica referentes ao planejamento e administração de empreendimentos do setor de alimentação. Mas isso e apenas um primeiro passo, um pontapé inicial. É preciso muito trabalho para se tornar um bom cozinheiro. Para ser um bom profissional a pessoa precisa de no mínimo 5 a 6 anos de profissão, de trabalho árduo dentro de uma, ou se possível, de várias cozinhas. Quanto mais lugares o sujeito trabalhar, mais conhecimento ele adquire.
- Que conselho você daria a alguém que queira ingressar na profissão?
- Pense duas vezes. Existe um livro chamado “Cozinha Confidencial”, do chef franco-americano Anthony Bourdain, onde ele relata os bastidores de uma cozinha profissional. Se depois da leitura você ainda quiser ser cozinheiro, seja bem vindo.
- Para finalizar, por que os homens se sobressaem como chefs de cozinha?
- Cada vez mais vejo mulheres na cozinha, tanto no Brasil como na Europa. Talvez essa predominância masculina se deva ao fato de que no passado, antes do advento da tecnologia, o trabalho nas cozinhas fosse ainda mais pesado que hoje, exigindo uma forca física que as mulheres em sua maioria não possuem. Refiro-me à cozinha profissional. Bater a massa de um bolo na mão e bater a massa de vinte bolos eram coisas diferentes, hoje em dia e só jogar tudo dentro da maquina e apertar um botão.

Fábio Messias - Revista Araçatuba Magazine - outubro de 2007
Ob. - Esse moço muito bonito alí da foto e muito inteligente tb é meu filho. Muito orgulhosa dele aqui. E saudosa demais. Uma saudade fininha e matadeira.
vera do val

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3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Oi!
Muito bom o blog de vocês.
Textos criativos e interessantes.
tenho um blog sobre livros também.
www.livrosemaislivros.blogspot.com
se não for pedir demais, gostaria que me linkassem no de vocês.
abraços

10 dezembro, 2007 15:59  
Blogger Leila Silva said...

Que legal, Vera. Muito boa esta entrevista e belo mesmo o rapaz. Sucesso para ele nas Zoropas. Feliz ano novo para toda a família.
Beijão
Leila

27 dezembro, 2007 13:35  
Blogger Unknown said...

Ah Moleque porreta!! cade o meu strogonoff com arroz & alho !
bom ter conhecido tu aqui em londrez!alem das suas tecnicas de cozinhas adoro tambem o os sabores que voce implementa nas suas receitas!
Passa o verao aqui em casa vamos fazem Tiger Prawns wrapped in Parma Ham marinated in coriander & curry leaves. Se cuida Paulo.

13 abril, 2009 11:44  

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